A inversão de valores ganhou adeptos, cresceu e atualmente aquele que não adere é julgado fora da ordem e desnaturalizado.
Há um processo imperceptível, gradual, que altera a ordem dos fatos e inverte posições. Kardec começa sua obra pelo Livro dos espíritos e a filosofia. Produz, na sequência, o Livro dos médiuns, promovendo a razão que explica os fatos e dá suporte à filosofia. Por fim, entra na natureza de Jesus e no seu ensino e assenta a moral consequente da filosofia inicial. Está, assim, formalizado o Espiritismo em bases que, para usar o lugar comum, representam uma construção sobre a rocha.
O processo de degradação – e não se imagine que falo aqui de pureza doutrinária – inicia-se logo a seguir e este processo pode ser elevado ao nível da naturalidade, mesmo que ele se dê, em verdade, no nível da cognição. Assim como a natureza leva a vida a alcançar rapidamente o seu ápice e depois entrar em declínio, a construção do conhecimento, em certa medida, obedece ao mesmo processo de apogeu e declínio.
O apogeu de Kardec encontra-se no momento em que a sua obra é colocada à disposição do leitor e não quando este leitor a completa; é ali, na exposição pública e incontrolável do pensamento em forma de discurso que o autor se dá à contemplação do conteúdo e à reflexão dos seus desdobramentos. Após, não pode mais controlar esses desdobramentos que surgem com a recepção, significando aqui o começo do declínio da obra e o início de construção de um novo conteúdo, que já não será mais tão-só o pensamento e as significações propostas pelo autor, mas a soma destas com as que o leitor então elabora. Leia o texto completo
Muito inteligente a forma como você aborda Kardec e o Espiritismo, gostei muito!