A essência da liberdade é a essência afetiva do bem e da justiça. Tudo o mais é liberdade sem espírito.

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Onde a liberdade do outro é por nós cerceada é um pouco da nossa liberdade que o é.

É absolutamente impensável adotar os princípios espíritas como base teórica do pensamento e não considerar o alto conceito de liberdade de que são dotados esses princípios. Esclarecendo, é impensável do ponto de vista da coerência, da lógica e das práticas no mundo da vida. A Liberdade – não a palavra, pois como se sabe nenhuma palavra tem relação direta com o seu objeto – é o bem maior, o fruto mais expressivo das leis da natureza e aquele que está na base da justiça e do progresso individual do ser humano.

Ser livre é respeitar, sempre. Não é apenas associar a uma doutrina, ideologia ou grupo social, família, partido ou clube esportivo. Nem mesmo manter ou deixar de manter ligação afetiva com as correntes de pensamento, sempre numerosas, dentro das associações, quando aquelas correntes se distanciam de nossas crenças. O respeito é laço, mas não prisão; oportunidade, mas não subserviência, forma de estar sem ser, em suma, concepção de liberdade e liberdade de manter concepções.

No discurso da liberdade, a teoria tem ocupado lugar precioso, mas não definitivo. Este só ocorre quando a teoria desce ao terreno das relações humanas e provoca ações simétricas, ou seja, se transforma em bem saber fazer bem, fazer saber, saber fazer. No estágio teórico, a liberdade é letra, no estágio completo a liberdade é o estado do bem, onde o que não é bem não é nada, não se consuma, não encontra espaço.

Ainda no plano teórico, a liberdade é um bem de que se tem posse quando se habita o plano humano. Ter liberdade não é ser livre, mas ter possibilidade de exercer o ato da escolha na relatividade do ser. E não há contradição quando a escolha recai na decisão de estar entre iguais e contrários ao mesmo tempo, pois é a lei natural que coloca o ser entre seus iguais e contrários como base do exercício do livre arbítrio. A tendência do ser é fugir dos contrários e estar entre os iguais, mas a plenitude possível da liberdade não se realiza quando se está apenas entre os iguais, onde a lei natural é parcialmente obstada.

O exercício da liberdade em seu estágio superior é um sofrimento atroz para aqueles que ainda precisam desse exercício para ampliar a própria liberdade. O ser e o estar contrário que ao outro satisfaz é o desafio da própria liberdade individual, pois provoca reações pouco afetivas, que não raro agridem a liberdade enquanto direito do outro. A administração das emoções quando o outro é o nosso contrário não é perda de parte da liberdade, mas desejo de mais liberdade, pois onde a liberdade do outro é por nós cerceada é um pouco da nossa liberdade que o é. Sentimentos mesquinhos, como ódios, são laços afetivos que mutilam duas liberdades: a minha e a do outro. Desfazer esses laços é aumentar a afetividade e conquistar mais poder de liberdade.

Estar entre iguais e contrários ao mesmo tempo é escolha quando se compreende que é o aspecto mais sábio da lei natural, pois podemos estar entre iguais e contrários sem que seja da nossa escolha ali estar, mas da lei que ali nos coloca. Pode-se saber estar e utilizar da liberdade para decidir estar com vistas a saber fazer saber querer, pois em minha liberdade de decidir eu posso dizer que quero para saber fazer a mim mesmo querer. Aí, a liberdade do mundo da vida, onde o ser resulta do fazer, que é sofrimento a princípio e felicidade como fim.

Estar entre os iguais também leva à descoberta de que se está entre os contrários ao mesmo tempo, pois os iguais se mostram diferentes quando pensam e decidem por coisas que, mesmo que surpreendam, estão no seu poder de decidir. A descoberta da liberdade de pensar como liberdade indominável e incontrolável é a confirmação de que o outro, que nos parece igual a nós, não deseja ceder naquilo que é o único bem que não se pode tirar a ninguém e, assim, sente-se diferente sem que a diferença divida e separe naquele instante.

Aquilo que une é aquilo que também separa. A desigualdade é a essência da igualdade que somente o ser livre pode compreender. Por isso mesmo, a liberdade é o respeito às diferenças no plano da justiça e do bem, onde o que o outro é, é porque é livre no seu direito de ser e decidir. A liberdade está para a justiça assim como o bem está para a liberdade. É na afetividade que o bem se concretiza, assim como a justiça. A essência da liberdade é a essência afetiva do bem e da justiça. Tudo o mais é liberdade sem espírito.

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Com as reflexões acima, presto minha homenagem a uma pessoa que muito admiro, literalmente dedicada à liberdade, à justiça e ao bem: Jacira Jacinto da Silva, que acaba de ser eleita para presidência da Cepa, um espaço onde a liberdade, com todos os seus empenhos desempenhos, continua modelar num mundo ocupado em diminuí-la.

By wgarcia

Professor universitário, jornalista, escritor, mestre em Comunicação e Mercado, especialista em Comunicação Jornalística.

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