Eugenio Lara em Breve Ensaio sobre o Humanismo Espírita enfrenta o desafio de refletir sobre o humanismo com o objetivo de demonstrar suas relações com o espiritismo e o próprio título que escolheu para o livro já é uma antecipação de sua conclusão: há um humanismo espírita. O que o título esconde – e isso o leitor terá de encontrar – é o caminho seguido para alcançar o termo.
O estudioso do espiritismo poderá argumentar que não poderia ser diferente, e afirmar que o espiritismo é a doutrina espiritualista de visão humanista de maior acento em nossos tempos, com o que o próprio autor concordará, sem dúvida.
É possível observar o estudo do Eugenio Lara sob diversos pontos de vista, pois apresenta um conteúdo rico, e discuti-lo, passo a passo, para provocar ou desafiar. Eugenio é polemista de boa cepa…
Por exemplo, suas palavras iniciais questionam certa visão do laicismo predominante em alguns círculos espíritas: “Normalmente, aqueles que se opõem à ideia de um Espiritismo de conotação laica associam, de modo ingênuo e equivocado, a laicidade ao antirreligiosismo, ao ateísmo…”.
Com isso, reafirma sua adesão ao pensamento laico ao mesmo tempo em que: 1) refuta uma postura que há muito o incomoda; 2) antecipa as relações do laicismo com o humanismo; 3) estabelece que “a laicidade no Espiritismo não está exclusivamente associada à separação entre o Estado e a Religião. Mas sim, fundamentalmente, ao seu caráter humanista…”.
O incômodo vem de longe e data do tempo em que os espíritas useanos laicos romperam politicamente com os espíritas useanos religiosos e, com a campanha nas ruas, foram acusados de pretender excluir Jesus do espiritismo, dando origem a algo que se transformaria em mito a partir do instante em que extrapolou os limites da USE e estendeu-se ao movimento espírita como um todo, onde os espíritas religiosos preponderam.
De lá para cá, estabeleceu-se uma clara divisão, ficando os laicos de um lado e os religiosos de outro. Se do ponto de vista da fraternidade humana o fato foi negativo, do ponto de vista do conhecimento houve ganhos, como prova agora este estudo sobre o humanismo, que vem na esteira de uma outra disposição presente entre os espíritas laicos, que Eugenio Lara não discute mas deixa implícita: a defesa do livre-pensar, este, também, um ganho importante.
Como é que o autor, então, chega a isto que se pode chamar de razão do estudo? O caminho por ele escolhido foi o de atualizar o estado da arte do humanismo, quando, então, tem a oportunidade de apresentar, embora ligeiros, estudos sobre pensadores pouco conhecidos, como Pico della Mirândola, e sobre outros mais destacados, dos quais extrai conteúdos significativos, até alcançar os tempos atuais e aqueles que pensam modernamente o humanismo.
Para haver um humanismo espírita era preciso que houvesse um Allan Kardec humanista, daí porque Eugenio Lara abre um dos mais interessantes capítulos de seu livro dedicado ao pedagogo Rivail e sua obra. A riqueza desse capítulo aparece tanto nas teses, pacíficas umas e polêmicas outras, quanto na forma de abordagem, onde, mais do que em qualquer outra parte do livro, o autor de fato se equilibra na corda bamba.
É pacífico quando afirma que “o Humanismo Espírita situa-se numa via alternativa entre o niilismo da concepção materialista e o dogmatismo da ideologia judaico-cristã”, mas ousado quando argumenta que “Allan Kardec evitou o confronto, a ruptura radical com a Igreja. Preferiu seguir o caminho da alteridade, do profundo respeito às tradições cristãs”. Ousadia de quem sabe que tem a oposição de autores como Herculano Pires, com quem Eugenio se alinha em aspectos outros, como, por exemplo, na tese do ser interexistencial que Herculano defende.
O livro é “breve”, mas tem um potencial extenso de provocar reflexões porque não deixa de colocar ideias e sugestões nos capítulos finais, nem se nega a tirar conclusões onde muitos prefeririam a maciez do estilo.